Além de dar
nome ao filme, Paterson é a um só tempo nome da cidade em que a
narrativa se desenrola e nome de seu inusitado morador. Essa sobreposição de
referências é uma das chaves iniciais para ler esse belíssimo elogio às
miudezas de nosso cotidiano, ansiosas por um olhar de poesia. Somos
constituídos pelos lugares que habitamos. Somos habitados pela geografia dessas
cidades invisíveis, que fundam caminhos pelos quais agimos no mundo. Alguns
deles em preto e branco, como os da personagem de Golshifteh Farahani (do
maravilhoso “Procurando Elly”); outros, em nuances que se refletem em pequenas
telas de vidro (da janela do ônibus, da caneca do bar, do visor do relógio...),
como os do personagem de Adam Drive (que vem chamando minha atenção depois do
inesquecível “Frances Ha” e do bom “Enquanto Somos Jovens”. Ainda não vi
"Silêncio"). Os dois formam o casal que vai costurando os dias que
passam... uma passagem lenta, rotineira, mas entrecortada por sobressaltos que
desafiam o andar costumeiro, o modus operandi do já-sei. Ao longo da semana,
com a sensibilidade de quem aprendeu a dar passos tortos por essas outras
cidades, Paterson vai colecionando alguns vagalumes, que o fazem perceber
escondido, no arranjo dos letreiros da caixinha de fósforos, por exemplo, um
megafone que anuncia a chama diária que acalenta aquela particular vida a dois.
É uma caixinha de fósforos que acende um poema de amor; que faísca uma imagem
que o acompanha ao longo do percurso ao trabalho e que é pensada em verso no
exato momento em que surge um casal de gêmeos (dos “matches”), um dentre vários
outros. Essas pequenas luzes vão guiando o habitante-cidade, “o motorista de
ônibus que lê Emily Dickinson”, a novos encontros, a novas dores, a novos
recomeços. É uma boa sensação acompanhá-lo do lado de cá da tela, mas mais
ainda é tentar aprender, como ele, a nos espantar com o caminho.
Nenhum comentário:
Postar um comentário